Quando ela sonhou, não era bem assim.
As coisas não tinham essa forma.
Braços, pernas, rosto, corpo.
Nada tinha esse jeito.
Ela carregava em seu ventre uma mini pessoa.
Carregava a pessoa que ela não foi.
Era uma pequena, loirinha, olhos cor de mel e sardas.
Era uma menina de sonhos.
Ela carregava e olhava sua barriga e seu sonho.
Às vezes sentava no sofá da sala e fazia como mãe, carinho em quem não via.
A música no som.
Clássicas músicas de ninar sonho.
Sonho cultivado 1, 2,3.
E não veio.
Ela se encolheu no canto.
Falou uma prece que não lembra qual foi.
Se trancou no banheiro pequeno.
Sentou ao lado da pia e leu uma oração escrita em papel.
Se fosse ela.
Ela não veio.
Ela de pés pequenos.
Pensou que queria vesti-la, alimentá-la, acalentá-la e dar tudo o que não teve.
Ela pensou e sonhou.
Parecia balão branco de história em quadrinho.
Balão que estoura com a tal realidade.
Ela queria mais, ela queria.
Não veio e o que restou foram as fotos que não tirou, os dias não celebrados, o abraço não dado e a mão amiga.
O que restou foram móveis baratos, palavras exaustas e corpo sem vida.
O que restou foi ela e só ela sabe porque restou.
Texto: Wandréa Marcinoni
Imagem: Olivia Bee
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