Manoel


Manoel de Barros é mais que um poeta. É na verdade um guardador de rebanhos, como o foi Fernando Pessoa em um de seus heterônimos. Manoel de Barros é um menino em um corpo senil. É o eterno menino que carregava água na peneira. É aquele que junta grãos de areia um a um para construir um castelo nada firme. Ele é como a essência de mim. Ele é terno, poético, enluarado. Ele é por-do-sol. ele é a falta de vergonha. Ele extrapola a minha timidez. Ele fala o que eu gostaria de dizer só que muito melhor.
Ele é assim:

Um homem catava pregos no chão
Sempre os encontrava deitados de comprido,
ou de lado,
ou de joelhos no chão.
Nunca de ponta.
Assim eles não furam mais – o homem pensava.
Eles não exercem mais a função de pregar.
São patrimônios inúteis da humanidade.
Ganharam o privilégio do abandono.
O homem passava o dia inteiro nessa função de catar
pregos enferrujados.
Acho que essa tarefa lhe dava algum estado.
Estado de pessoas que se enfeitam a trapos.
Catar coisas inúteis garante a soberania do Ser.
Garante a soberania de Ser mais do que Ter.


Imagem: Shiori Matsumoto

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